Depois da complexa relação entre luz e CO2 para o desenvolvimento das plantas, os nutrientes são o terceiro pilar essencial para o sucesso do aquário plantado. Quando falamos em nutrientes falamos do sistema de substrato e também da fertilização, sejam de sais ou de líquidos (no fundo é a mesma coisa, sendo o segundo a diluição apropriada do primeiro). A questão central desse artigo é a relação entre o substrato fértil e a fertilização a nível radicular.
Os aquaristas mais sérios e experientes nem discutem esse assunto, eles investem pesado na fertilização, pois sabem que sem ela o aquário simplesmente não consegue sobreviver. Quem ainda não acredita nesse fato por achar que é um golpe de marketing das marcas e acha que o substrato já é o suficiente vai continuar falhando com seus aquários. Então isso se tornou uma lei: fertilização suplementar é imprescindível para o aquário plantado. Mas por quê? Por que as plantas aquáticas não conseguem sobreviver exclusivamente do substrato como as plantas terrestres? Por que elas são tão dependentes de nós aquaristas?
Antes de discorrer sobre o assunto, precisamos esclarecer as diferenças básicas entre o substrato e os fertilizantes líquidos. Embora ambos sirvam de sistemas de nutrição, o substrato, além de servir também como base de ancoragem das raízes, funciona como um suprimento gradual e de longo prazo de nutrientes. Sua liberação é lenta e interage quimicamente de maneira igualmente lenta com a água. No substrato maturado alguns nutrientes são inclusive reciclados. Já a fertilização age como uma injeção prontamente disponível de nutrientes, mas, em contrapartida, degrada muito mais rápido ao interagir com a água e depende do substrato para se reciclar. Então um funciona como o complemento do outro ou, em outras palavras, ambos formam um único kit de nutrição. Um para o longo prazo de liberação lenta e constante e outro para o curto prazo de liberação e degradação rápida.

Figura 1 – Substrato fértil terroso usado no aquário plantado
Agora podemos voltar ao assunto.
Bem, conforme já estudamos num artigo anterior sobre o que o Carbono representa para as plantas aquáticas, as plantas anfíbias não foram feitas para viverem permanentemente em estado imerso. Em estado natural elas toleram a fase imersa sobrevivendo de reservas e recursos mínimos para posteriormente alcançar a vida emersa e gozar de plenas condições de sobrevivência para completar seu ciclo de vida. No aquário, uma vez que as forçamos a viver na forma imersa em troca de condições artificialmente satisfatórias com excelente oferta de CO2 e luz, as plantas apresentam um desenvolvimento atipicamente rápido e vigoroso. Isso demanda uma quantidade muito grande de nutrientes prontamente assimiláveis para terem um desenvolvimento pleno.
Entende-se como desenvolvimento pleno aquele em que não há carências nutricionais, os quais acarretariam qualquer prejuízo ao crescimento, por mínimo que fosse. Já sabemos que essas carências desencadeiam as algas e a competição por recursos fica ainda mais acirrada, portanto, a fertilização, por promover a nutrição plena das plantas acaba por inibir a competição entre plantas e algas.
Uma coisa que é preciso ter em mente – e acho uma ótima oportunidade para discursar sobre isso agora – é que é um erro comparar as plantas terrestres com as plantas aquáticas. As plantas terrestres, dependendo apenas do solo para sobreviver, também apresentam várias carências. É muito raro encontrar uma planta, pode ser inclusive uma árvore, que esteja vivendo totalmente ilesa de carências nutricionais. Sempre há uma porção de folhas amarelas, furadas, as vezes retorcidas, etc. A planta continuará lá, nada de muito grave vai lhe acontecer se essas carências não forem muito severas. Já no ambiente aquático qualquer dessas carências ativa a proliferação das algas muito rapidamente. Então é por isso que quando se trata de desenvolvimento das plantas aquáticas no aquário é preciso reforçar sempre a necessidade do desenvolvimento pleno.
Tanto as plantas terrestres quanto aquáticas são capazes de assimilar nutrientes tanto pelas raízes quanto pelas folhas. Obviamente as raízes evoluíram células e mecanismos especializados para absorver nutrientes de maneira muito mais eficiente que as folhas, mas a absorção foliar também é importante porque provê nutrição aos órgãos aéreos de maneira localizada mais rapidamente de forma a sanar eventuais carências sem exigir que as plantas comecem a mobilizar nutrientes ou estoques de outros órgãos. Isso é especialmente útil se tratando de nutrientes imóveis como o cálcio e o ferro, por exemplo, e se torna mais fácil nas plantas aquáticas que apresentam folhas mais finas e permeáveis à entrada da água. Em outras palavras, a fertilização torna o ambiente todo fértil e não apenas o substrato.
É válido salientar que a porção “desperdiçada” da fertilização, aquela parte degradada (geralmente precipitada) pela água antes que possa ser assimilada pelas plantas, vai se depositando no substrato, ainda que de forma invisível. Esse resíduo, ao penetrar no substrato e alcançar as camadas mais redutoras (é preciso que o substrato esteja maturado para esse ciclo ocorrer) ajuda a repor as reservas do substrato e nutre as raízes a longo prazo.
A maturação do substrato se refere não somente à estratificação das camadas oxidantes e redutoras (aquelas com poder de precipitar e solubilizar respectivamente), mas também à formação de colônias microbiológicas benéficas para as plantas. Isso é um assunto muito pouco discutido no aquarismo, mas é de vital importância para assegurar a nutrição das plantas. As plantas não dependem somente do substrato em contato com as raízes para se nutrirem, é necessário que essas colônias, chamadas de rizobactérias e micorrizas (quando se referem também aos fungos associados), se estabeleçam em número e diversidade necessária para transformar os nutrientes presentes no substrato em espécies químicas mais assimiláveis.
As rizobactérias também podem fornecer subprodutos muito benéficos às plantas como aminoácidos e agentes antibióticos contra agentes patógenos, além de regular quimicamente a rizosfera (ambiente ao redor das raízes) quanto ao pH e poder redox pela liberação de diversos ácidos orgânicos, os quais aumentam a disponibilidade de metais como ferro, zinco e manganês por agirem como quelantes. Elas produzem inclusive hormônios do crescimento como auxinas e citocininas, o que até há algum tempo se acreditava que somente as células vegetais eram capazes de produzir. A área e densidade capilar das raízes também é aumentada, promovendo um desenvolvimento indireto sobre as partes aéreas das plantas por potencializar a absorção de água e nutrientes.

Figura 2 – Sistema radicular com rizobactérias
As plantas são inteiramente dependentes dessa interação e diversas experiências tem provado que as bactérias também, de forma que esses microrganismos não são encontrados em mesmo número e diversidade em solos sem raízes e que as plantas não conseguem se desenvolver quando esses microrganismos são impedidos de formar colônias por ação de antibióticos, por exemplo.
Já tive uma experiência pessoal em que tratei uma lesão séria de um botia palhaço com tetraciclina dentro do próprio aquário plantado. A ferida curou muito rapidamente da infecção, mas as plantas estagnaram totalmente o crescimento por quase um ano inteiro. As plantas de rizoma perderam as folhas e as plantas de caule apodreceram e morreram. Mesmo as plantas novas definhavam no aquário e foi quando percebi que havia algo errado com o ambiente de forma geral: o substrato e a rizosfera estavam estéreis. Foi a oportunidade perfeita para os surtos de algas. Passado um ano as plantas voltaram a produzir brotos e retomaram o crescimento normal e as algas regrediram. Atribuí o problema à tetraciclina que provavelmente esterilizou a rizosfera e cortou uma via vital de entrada de nutrientes às plantas. Eu acreditava que essa relação só existia nas plantas fixadoras de N2 atmosférico, mas eu estava errado, a relação raiz/microrganismos é muito mais complexa e vital do que eu poderia imaginar.
Com a recente escassez de Eritromicina no mercado para o tratamento das cianobactérias e a substituição desta pela Azitromicina, mais forte e com maior espectro de ação, principalmente sobre as bactérias gram-negativas (justamente como a maioria das rizobactérias) pode aumentar o risco de estrangular o aquário pelo extermínio das rizobactérias. Portanto, o uso de antibióticos para o tratamento de cianobactérias deve ser feito em último caso sempre respeitando os dias e doses para tratamento. Deve-se evitar ao máximo repetir o tratamento no mesmo aquário em períodos muito próximos e jamais administrar super dosagens. O tratamento de doenças infecciosas nos peixes, por sua vez, nunca deve ser feito no aquário plantado.

Figura 3 – Imagem microscópica da raiz associada a microrganismos
Retornando à questão da fertilização, as rizobactérias se nutrem pelos mesmos nutrientes que as plantas e a sinergia entre eles só é promovida quando ambos estão satisfatoriamente nutridos. Quando há escassez de um ou mais nutrientes as rizobactérias passam a agir como concorrentes das plantas e suas necessidades passam a ser boicotadas. Em outras palavras, as plantas aquáticas são reféns das rizobactérias e devemos promover a nutrição de ambos de maneira plena. Essa é a razão pela qual aquários sem sistema de substrato fértil ou substrato muito velho não conseguem sobreviver, a demanda nutricional a nível de substrato é muito grande e não pode ser negligenciada. Essa demanda acaba exigindo também a suplementação com fertilizantes, pois a velocidade de liberação do substrato pode não ser satisfatória, ainda mais se tratando de aquários densamente plantados com atividade radicular muito intensa. É de importância crucial que o substrato apresente um bom CTC (capacidade de troca catiônica promovida pelo conteúdo de matéria orgânica), seja de base argilosa ou terrosa (bom conteúdo de metais) e que contenha alguma carga calcária para assegurar um bom tamponamento.

Figura 4 – A saúde das plantas é promovida pela nutrição também das rizobactérias.
Com base nesse estudo, podemos admitir que as rizobactérias, embora não seja de conhecimento da grande maioria dos aquaristas, é tão ou mais importante que as colônias nitrificantes do biofiltro por incidir diretamente sobre a sobrevivência das plantas.
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É uma família de fertilizantes projetada e criada pelo Eduardo Fonseca Jr, estudioso da ciência do aquário plantado, escritor de quatro livros do assunto (de título A Ciência do Aquário Plantado). Clique aqui e conheça a linha de produtos FLORAUP!
